Em “A Confissão da Leoa”, Mia Couto nos leva, mais uma vez, para o misterioso mundo situado entre o real e o fantástico. Neste caso, quem
serve de palco para essa mistura é uma pequena e distante aldeia moçambicana aonde
ataques de leões vem se tornando cada vez mais frequentes. No centro do
problema estão os dois personagens que narram a história. O caçador Arcanjo
Baleiro, contratado para matar os leões que rondam o local. E Mariamar, uma
jovem e humilde moradora da aldeia que teve uma de suas irmãs morta por um
leão.
Duas narrativas diferentes saem destes dois personagens
também muito diferentes. Arcanjo, inicialmente uma figura de força e razão, vai
aos poucos mostrando um verdadeiro poço de emoções e sentimentos. Mariamar,
aparentemente frágil, dramática e sonhadora, traz uma incrível lucidez carregada
de simbolismos.
A história toda é simples e sem as divagações dos narradores
poderia ser ainda menor. Acredito que mesmo “dividindo” o texto entre um homem
e uma mulher, Couto quis tocar especialmente a alma feminina. Ela é o centro de
tudo. Com as limitações de homem querendo descrever sentimentos na visão de uma
mulher, o autor consegue alcançar um pouco do peso que mulheres tão cheias de
sofrimento, como Mariamar, carregam.
O final do livro é desses que chega de repente e te deixa
sem reação. Mas, também te faz pensar em todos os significados que aquela
mistura de prosa poética com emoções exacerbadas e, claro, um bom toque do
imaginário folclórico africano possuem.
Separei algumas frases do livro que me marcaram, foram
muitas.
“Quanto mais vazia a vida, mas ela é habitada por aqueles que já foram: os exilados, os loucos, os falecidos.”
“As ossadas são a nossa única eternidade. Vai-se o corpo, esmorecem as lembranças. Restam os ossos para sempre.”
“Só os humanos sabem do silêncio. Para os demais bichos, o mundo nunca está calado e até o crescer das ervas e o desabrochar das pétalas fazem um enorme barulho.”
“As dores passam, mas não desaparecem. Elas migram para dentro de nós, alojam-se algures no nosso ser, submersas num fundo de lago.”
“Ninguém pede mais a atenção de uma mãe que um filho morto.”
“Morrer na água é um regresso.”
Caixa de comentário é imã de gente babaca, mas aqui está meu voto de confiança em você! ;)